DIREITO TRIBUTÁRIO
Diante dessas premissas, o STF está tentando mudar o entendimento
sobre as coisas julgadas que deram procedência ao pedido de algumas empresas e conseguiram a procedência para impedir cobrança de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido
(CSLL), pois foram consideradas inconstitucionais.
A doutrina já tem a resposta para essa questões, em especial, o jurista Humberto Teodoro Junior que explana melhor.
A importância da coisa julgada, em especial quanto ao caráter de
imutabilidade, indiscutibilidade e a relevância de seu papel no plano da
pacificação social e da segurança das relações jurídicas de direito material deveria
ser um consenso.
A lei e a doutrina enfrentam estas indagações por meio de teses
nominadas “limites objetivos da
coisa julgada” e
“limites subjetivos da coisa julgada”.
Desde 1973, o artigo 468 do CPC, previa que “a sentença, que julgar total ou parcialmente
a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas”
e o art. 469 complementava: “Não fazem coisa julgada: os motivos, ainda que importantes para determinar o
alcance da parte dispositiva da
sentença” (inciso I); e tampouco o faz “a apreciação da questão prejudicial,
decidida incidentemente no processo” (inciso III).
Após alguma controvérsia na doutrina, acabou prevalecendo na
jurisprudência o entendimento de que o objeto do processo (a lide) seria
identificado por meio do pedido e,
portanto, o limite objetivo da coisa julgada seria identificado pelo dispositivo da sentença, já que nele estaria
contida a resposta procurada pelo litigante junto ao juízo.
Eis como a matéria se cristalizou durante a vigência do
CPC/1973:
a) “Os
motivos não fazem coisa julgada. Também não o faz, igualmente quanto aos
limites objetivos, a causa de pedir, isoladamente”.
b) “A coisa julgada incide apenas sobre o
dispositivo propriamente dito da sentença, não sobre os motivos ou sobre
questão prejudicial [CPC, art. 469, I e III], salvante quanto a esta a propositura de ação declaratória incidental”.
c) Nem mesmo a causa petendi (fundamento jurídico do pedido) se incluia no campo da coisa julgada material
formada sobre a solução dada, pelo dispositivo da sentença, ao pedido. A imutabilidade própria da coisa julgada só
alcança a causa de pedir, enquanto elemento identificador da extensão ou
alcance do próprio pedido. Não a alcança, isoladamente, “pena de violação do
disposto no art. 469, I do CPC”
Desde 2015, os limites
objetivos da coisa julgada veio superar a teoria da coisa julgada sobre o
pedido e consagração da coisa julgada sobre a questão resolvida.
Tendo o CPC/2015 adotado como limite objetivo da força da coisa
julgada material a solução de mérito dada pela sentença à questão principal originária (art. 503, caput e § 1º) e à questão prejudicial incidentalmente decidida no
processo, não há, doravante, como insistir na velha teoria de CHIOVENDA,
segundo a qual não é todo o conteúdo da sentença que transita em julgado, mas
apenas o seu dispositivo. Nessa ótica, os
motivos e fundamentos da conclusão do decisório ficariam fora do campo de
incidência da res iudicata.
Entretanto, a correlação que se tem de fazer é entre o objeto do
processo e o pronunciamento que a sentença efetuou para solucioná-lo. Dentro do
processo uma situação jurídica litigiosa reclamou o acertamento judicial, de
maneira que é esse acertamento que, em nome da segurança jurídica, se sujeitará
à força ou autoridade da res iudicata.
julgar uma causa, em seu mérito, consiste justamente em
resolver as questões que integram o objeto do processo (o objeto
litigioso).
Em termos
práticos, o que deve ser pesquisado é aquilo, dentro do pronunciamento
judicial, que tem de ser conservado imutável para que “não perca autoridade o
que restou decidido”, como adverte JORDI NIEVA-FENOLL. Explica o autor que é
preciso apurar, no bojo do processo findo, quais são as questões decididas que
“conferem estabilidade à sentença”. O processo só cumprirá sua função de lograr
a composição definitiva do litígio se proporcionar garantia de permanência à
solução de tais questões. Então, para apurar qual parte do decisório adquiriu a
indiscutibilidade própria da res iudicata, “é necessário determinar quais
pronunciamentos exigem estabilidade para não comprometer o valor do processo já
concluído”.
Nas origens remotas do instituto, sempre se
explicou a coisa julgada pela simples finalidade de vetar, em nome da segurança
jurídica, a renovação do julgamento de uma causa já definitivamente decidida.
Ora, julgar uma causa, em seu mérito, consiste justamente em resolver as
questões que integram o objeto do processo (o objeto litigioso). Por isso, o
artigo 503 do CPC/2015, na perspectiva de delimitar a coisa julgada, afirma que a sentença de mérito “tem força
de lei nos limites da questão principal expressamente decidida”. E o art. 505,
em seguida, aduz que “NENHUM JUIZ DECIDIRÁ NOVAMENTE AS QUESTÕES JÁ DECIDIDAS
RELATIVAS À MESMA LIDE” ?
Na verdade, não é o pedido que o juiz decide direta e unicamente, como aparentemente se deduz do dispositivo de uma sentença. Ali só se chega por meio da resolução de todas as questões relevantes do litígio, de maneira que o dispositivo não é mais que a resultante necessária de todas as decisões das questões que compõem o objeto litigioso.
O provimento judicial de mérito é, em suma, o conjunto indissociável de todas as questões resolvidas que motivaram a resposta jurisdicional à demanda enunciada no dispositivo da sentença. Se estas questões não se estabilizarem juntamente com a resposta-síntese, jamais se logrará conferir segurança à situação jurídica discutida e solucionada no provimento. É, por isso, que a doutrina processual mais evoluída de nossos dias vê como alcançada pela segurança jurídica proporcionada pela coisa julgada não esta ou aquela parte da sentença, mas toda a situação jurídica material objeto do acertamento contido no provimento definitivo de mérito. Não pode, em tal perspectiva, permanecer fora da autoridade da res iudicata a solução da questão principal (i.e., a causa de pedir, seja a invocada pelo autor, seja a que fundamenta a resistência do réu).
De tal sorte, toda resolução de questão
qualificada como principal feita pela decisão de mérito assume força de lei
(art. 503), entre as partes, tornando-se no devido tempo imutável e
indiscutível (art. 502), e por consequência, impedirá que qualquer juiz volte a
rejulgá-la (art. 505), entre os mesmos litigantes (art. 506).
Ao
estender a coisa julgada à questão prejudicial, independentemente de pedido de
declaração incidental formulado pela parte, o CPC/2015 (art. 503, § 1º) tornou
questão principal, para efeito de estabelecimento dos limites objetivos da res
iudicata, todas as questões de mérito cuja solução tenha sido, lógica e
juridicamente, necessária para resolução do objeto litigioso do processo.
Existe, em tal sistemática, questão principal formulada mediante o pedido da
parte e questão tornada principal pela necessidade lógica de enfrentamento pelo
julgador, na obra de construir a sentença de mérito (resolução do objeto
litigioso deduzido pela parte). Não é
mais possível, portanto, continuar defendendo a tese de que a imutabilidade e
indiscutibilidade da sentença passada em julgado se restringe ao seu
dispositivo, não alcançando as questões trazidas como fundamento do pedido, se
sobre elas a parte não houver requerido a declaração judicial. Toda questão
substancial a que se subordinou a solução do mérito da causa, com ou sem pedido
da parte, entende-se alcançada pela coisa julgada, se sem sua integração não
for possível manter-se a situação estabelecida pela sentença para a composição
definitiva do objeto litigioso do processo.
Por isso mesmo, impende reconhecer que “a tradicional restrição da coisa julgada ao dispositivo [da sentença] reflete uma perspectiva excessivamente liberal a privatista, incompatível não apenas com a natureza pública do processo como também com os princípios da economia processual, da segurança jurídica, de contraditório-influência e da cooperação, consagrados pelo Código de Processo Civil de 2015”.