INFRAÇÕES NO TRÂNSITO E ALTERNATIVAS DE DEFESA

INFRAÇÕES NO TRÂNSITO E ALTERNATIVAS DE DEFESA

*Advogado, Pedagogo e Mestre em Direito Internacional Adelar Bitencourt Rozin

Quando o primeiro ser vivente pensou e inventou a roda não imaginava quantas preocupações, mudanças, movimentos, estudos, lutas, acidentes, conquistas, alegrias e tristezas seriam produzidas com aquela ação.

Pensamos e como pensadores sabemos que o Trânsito além de ser uma das preocupações da gestão pública, também é uma “galinha dos ovos de ouro” para Governadores e Prefeitos. Por uma ou outra situação, é importante a necessidade de disciplina e os meios de ampla defesa contra erros ou excessos.

Como toda ação humana é passível de erros, o trânsito foi disciplinado com regras, ou seja, leis, convenções, sinais e resoluções. No meio dessas regras estão a CNH, testes, auto escolas, multas, emplacamentos, vistorias, Guardas, Policias Rodoviárias, Prisões, confiscos ou apreensões, educação para o trânsito, Justiça, Recursos, pedágios, parquímetros, etc...

Na maioria somos seres ativos, em movimento, seja pelo transporte coletivo, carros particulares ou ainda de motocicleta, bicicleta ou a pé, enfim, o trânsito está presente em todas as atividades do cidadão.

Os problemas no trânsito podem significar afastamento do trabalho, reposição dessa mão-de-obra, atrasos em cronogramas, decisões, desabastecimento de alimento, água, remédios, socorros ambulatorial, stress, vidas ceifadas, sequelas, além de custos extras que refletem em toda a cadeia de negócios e economia.

Diante dessas premissas, o foco nas infrações e na possibilidade do cidadão recorrer ou impugnar é o alvo do estudo.

O tema proposto para análise é a infração de trânsito, que trilha dentro da legalidade e deve preencher vários requisitos processuais administrativos, antes que uma penalidade seja definitivamente aplicada ao condutor. Todavia, nem sempre estes procedimentos são observados, levando à nulidade da multa e agora vamos ver alguns deles:

1.- O PRAZO LEGAL DE NOTIFICAÇÃO:

O PROCESSO ADMINISTRATIVO:

Seção I - Da Autuação
Art. 281
A autoridade de trânsito, na esfera da competência estabelecida neste Código e dentro de sua circunscrição, julgará a consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível.
Parágrafo único. O auto de infração será arquivado e seu registro julgado insubsistente:
I - se considerado inconsistente ou irregular;
II - se, no prazo máximo de trinta dias, não for expedida a notificação da autuação.
(Redação do inciso II dada pela Lei n. 9.602/98)

Art. 281-A.
Na notificação de autuação e no auto de infração, quando valer como notificação de autuação, deverá constar o prazo para apresentação de defesa prévia, que não será inferior a 30 (trinta) dias, contado da data de expedição da notificação.
(Artigo 281-A incluído pela Lei n. 14.071/20, em vigor a partir de 12ABR21)

2. A AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA

Outra falha muito comum é a ausência de prévia notificação à aplicação de penalidade. Ou seja, ocorre quando o Auto de Infração é aplicado sem prévia notificação do condutor para promover sua defesa.

Ao instaurar um processo administrativo de penalidade, esta Autoridade deveria de imediato garantir o direito ao contraditório e à ampla defesa, conforme expressa previsão do CTB:

Art. 282. Aplicada a penalidade, será expedida notificação ao proprietário do veículo ou ao infrator, por remessa postal ou por qualquer outro meio tecnológico hábil, que assegure a ciência da imposição da penalidade.

Trata-se de regra sumulada pelo STJ:

Súmula 312: No processo administrativo para imposição de multa de trânsito, são necessárias as notificações da autuação e da aplicação da pena decorrente da infração. A ausência de oportunidade prévia trata-se de manifesta quebra do direito constitucional à ampla defesa, conforme análise dos tribunais:

ADMINISTRATIVO. MULTA DE TRÂNSITO. LAVRATURA DO AUTO DE INFRAÇÃO. PROCEDIMENTO. ARTIGOS 280, 281 E 282 DO CTB. SÚMULA 312 STJ. DUPLA NOTIFICAÇÃO. ENDEREÇAMENTO DA NOTIFICAÇÃO À RESIDÊNCIA DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO. NÃO COMPROVADO. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. No procedimento de aplicação da multa de trânsito se exige a notificação do infrator em duas oportunidades. A primeira é a notificação do cometimento da infração, que oportunizará a apresentação da chamada 'defesa prévia'. A outra notificação é da aplicação da penalidade, após o julgamento da consistência do auto de infração de trânsito, forte nos artigos 280, 281 e 282 do Código de Trânsito Brasileiro. Demonstrado pela parte autora que as notificações não foram oportunamente enviadas para o endereço do proprietário do veículo devidamente cadastrado no órgão de trânsito, porém a ele foi direcionada a penalização decorrente do auto de infração, atribui-se ao DNIT a responsabilidade pela ausência de conhecimento da autuação e da aplicação da penalidade, e opera-se no caso concreto a decadência do direito de punir. (TRF-4, AC 5001745-97.2019.4.04.7118, Relator(a): MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, QUARTA TURMA, Julgado em: 05/02/2020, Publicado em: 05/02/2020)

A doutrina, no mesmo sentido segue este entendimento.
"É sabido que a ampla defesa e o contraditório não alcançam apenas o processo penal, mas também o administrativo, nos termos do art. 5º, LV da CF/88. É que a Constituição estende essas garantias a todos os processos, punitivos ou não, bastando haver litígios". (Harrison Leite, Manual de Direito Financeiro, Editora jus podivum, 3ª edição, 2014, p. 349)

Portanto, a aplicação de multa sem a oportunização à prévia defesa, configura nítida quebra do contraditório e da ampla defesa, razão pela qual, requer a imediata suspensão da pena aplicada, por manifesta ilegalidade.

3. DUPLA PENALIDADE PELA MESMA INFRAÇÃO

Em alguns casos, o condutor é duplamente penalizado pelo mesmo ato, como por exemplo duas multas de excesso de velocidade com segundos de diferença.

Tal fato configura bis in idem, amplamente conhecido como "princípio da vedação da dupla punição pelo mesmo fato", ocasionando desta forma uma condenação dupla pela mesma infração, conforme vedado pela jurisprudência:

ADMINISTRATIVO. LAVRATURA DE DOIS AUTOS DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO POR ESTACIONAMENTO PROIBIDO. MESMO LOCAL E DIA. DUPLICIDADE DE PENALIDADE PELO MESMO FATO. BIS IN IDEM. VEDAÇÃO. Os dois autos de infração foram lavrados no mesmo dia por fiscais distintos com diferença de cerca de 6 horas entre ambos, levando a crer que se referem ao mesmo fato, de modo que a imposição de ambos configuraria bis in idem, o que é vedado no ordenamento jurídico brasileiro. Sentença mantida para anular um dos autos de infração. (TJ-RO - RI: 00051465920128220601 RO 0005146-59.2012.822.0601, Relator: Juiz Franklin Vieira dos Santos, Data de Julgamento: 30/08/2013, Turma Recursal - Porto Velho, Data de Publicação: Processo publicado no Diário Oficial em 09/09/2013.)

Tratam-se de algumas das irregularidades usualmente encontradas em processos administrativos sancionadores.

4.- AUSÊNCIA OU FALHA NA SINALIZAÇÃO POR MEIO DE PLACAS:


Considerando que no local e em quilômetros antecedentes e sucedentes ao local da autuação(medição) não existia qualquer placa sinalizadora da velocidade permitida na rodovia.

DOS LOCAIS DE FISCALIZAÇÃO E DA SINALIZAÇÃO

Art. 10. Os locais em que houver fiscalização de excesso de velocidade por meio de medidores do tipo fixo devem ser precedidos de sinalização com placa R-19, na forma estabelecida nesta Resolução e no Manual Brasileiro de Sinalização de Trânsito - Volume I (MBST-I), de forma a garantir a segurança viária e informar aos condutores dos veículos a velocidade máxima permitida para o local.

§ 1º Onde houver redução de velocidade, deve ser observada a existência de placas R-19, informando a redução gradual do limite de velocidade conforme MBST-I.

§ 2º Deve ser instalada a placa R-19 junto a cada medidor de velocidade do tipo fixo.

Art. 11. As placas de identificação R-19 devem ser posicionadas com distância máxima relativamente aos medidores, na forma estabelecida no ANEXO IV, facultada a repetição da placa em distâncias menores.

§ 1º Em vias com duas ou mais faixas de trânsito por sentido, a sinalização, por meio da placa de regulamentação R-19, deve estar afixada nos dois lados da pista ou suspensa sobre a via, nos termos do MBST-I.

§ 2º Em vias em que haja acesso de veículos por outra via pública, no trecho compreendido entre o acesso e o medidor de velocidade, deve ser acrescida, nesse trecho, sinalização por meio de placa R-19.

§ 3º Para fins de fiscalização do excesso de velocidade, é vedada a utilização de placa R-19 que não seja fixa.

A RESOLUÇÃO Nº 798, DE 2 DE SETEMBRO DE 2020, que dispõe sobre requisitos técnicos mínimos para a fiscalização da velocidade de veículos automotores, elétricos, reboques e semirreboques.

Art. 1º Esta Resolução dispõe sobre requisitos técnicos mínimos para a fiscalização da velocidade de veículos automotores, elétricos, reboques e semirreboques.

CAPÍTULO I
DA FORMA E PROCEDIMENTOS DE FISCALIZAÇÃO DE VELOCIDADE

Art. 2º A medição de velocidade que exceda o limite regulamentar para o local, desenvolvida pelos veículos automotores, elétricos, reboques e semirreboques nas vias terrestres abertas à circulação, deve ser efetuada por medidor de velocidade nos termos desta Resolução.

§ 1º Considera-se medidor de velocidade o instrumento ou equipamento de aferição destinado a fiscalizar o limite máximo de velocidade regulamentado para o local, que indique a velocidade medida e contenha dispositivo registrador de imagem que comprove o cometimento da infração.

§ 2º A medição de velocidade, por meio do medidor descrito no § 1º, é indispensável para a caracterização das infrações de trânsito de excesso de velocidade.

Art. 7º O uso de medidores do tipo portátil para a fiscalização do excesso de velocidade é restrito às seguintes situações:

II - nas vias rurais, quando a velocidade máxima permitida for igual ou superior a:

a) 80 km/h (oitenta quilômetros por hora), em RODOVIA ; e

b) 60 km/h (sessenta quilômetros por hora), em estrada.

§ 1º Para utilização do equipamento portátil, deve ser realizado planejamento operacional prévio em trechos ou locais:

I - com potencial ocorrência de acidentes de trânsito;

II - que tenham histórico de acidentes de trânsito que geraram mortes ou lesões; ou

III - em que haja recorrente inobservância dos limites de velocidade previstos para a referida via ou trecho.

§ 2º O órgão ou entidade com circunscrição sobre a via deve mapear e publicar em seu site na rede mundial de computadores relação de trechos ou locais em que está apto a ser fiscalizado o excesso de velocidade por meio de equipamento portátil.

§ 3º Nos locais em que houver instalado medidor de velocidade do tipo fixo, os medidores de velocidade portáteis somente podem ser utilizados a uma distância mínima de:
I - 500 m (quinhentos metros), em vias urbanas e em trechos de vias rurais com características de via urbana; e
II - 2.000 m (dois mil metros), para os demais trechos de vias rurais.

§ 4º Os medidores de velocidade do tipo portátil somente devem ser utilizados por autoridade de trânsito ou seu agente, no exercício regular de suas funções, devidamente uniformizados, em ações de fiscalização, não podendo haver obstrução da visibilidade, do equipamento e de seu operador, por placas, árvores, postes, passarelas, pontes, viadutos, marquises, ou qualquer outra forma que impeça a sua ostensividade.

As tabelas infra ilustram alguns exemplos de  limites que devem ser observados na aplicação da fiscalização pública para fins de punição.

Em rodovias, estradas e vias trânsito rápido, a fiscalização por radar não fixo só é permitida se a via for provida da placa R-19 e onde não ocorra variação de velocidade em trechos menores que 5 km.

Para a fiscalização com radares do tipo fixo, estático ou portátil, deve ser observada uma distância entre a placa R-19 e o radar, compreendida no intervalo estabelecido na tabela constante do Anexo IV da resolução mencionada, facultada a repetição da placa em distâncias menores:




O maior dificuldade para o cidadão condutor e para o profissional operador do direito é o contraditório( defesa ) diante da fé publica outorgada a autoridade que aplica a multa. Ainda bem que recentemente existe a possibilidade real de contrapor com fé publica por meio de um documento chamado de ATA NOTARIAL.

A lei processual civil trouxe poder ao Sr. Tabelião da comarca para descrever o local do trânsito, do acidente ou da ausência de sinalização por meio de ATA NOTARIAL.

A parte lesada pela multa ilegal, traz aqui a prova determinada pelo CPC, chamada de ATA NOTARIAL:

O Código de Processo Civil trouxe uma inovação para direito, em geral no Capítulo XXII “das provas”, Seção III “da ata notarial”, onde a ata notarial tem grande força probante do documento, pelo disposto no Artigo 384 e 405 do CPC:

Art. 384 do CPC - A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.
Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.

Art. 405 do CPC - O documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o chefe de secretaria, o tabelião ou o servidor declarar que ocorreram em sua presença.

Já no Código Civil, traz a disposição de prova plena e força probante os documentos lançados em ata notarial, dispostos Artigos 215 e 217 do CC:

Art. 215 do CC - A escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é documento dotado de fé pública, fazendo prova plena.

Art. 217 do CC - Terão a mesma força probante os traslados e as certidões, extraídos por tabelião ou oficial de registro, de instrumentos ou documentos lançados em suas notas.


5.- O recurso por meio de um profissional do Direito ou agente facilitador ( despachante ) é essencial para anular as multas errôneas.

No caso de suspensão do direito de dirigir, é possível recorrer 3 (três) vezes administrativamente: - Defesa Prévia, Recurso de 1ª Instância (JARI) e o recurso de 2ª Instância (CETRAN). Desde que o prazo seja observado.

Necessário observar também que ao enviar o recurso da multa, estar enviando os seguintes documentos junto a ele: 1.- Cópia da multa frente e verso; 2.- Cópia ou original conforme o caso da CNH ; 3.- RG e documentação do carro (CRLV).

Alguns DETRANS dispõem de modelo formulário de recurso, então pesquise bem ou procure o profissional da confiança e proceda com o seu recurso da seguinte maneira:
Dirija-se ao presidente do órgão que te multou.
No preâmbulo informe seus dados pessoais como nome completo, naturalidade, RG, CPF e CNH, entre outros.
Em seguida, informe os dados do veículo da infração, como marca, modelo placa e Renavam.
Informe também o dia, local e horário da suposta infração, justificando-se e utilizando sua estratégia de defesa juntamente com as teses legais e resoluções;
É importante redigir o texto de forma formal;
Por último, solicite o deferimento do recurso e a suspensão das penas (como pontos e o valor a ser pago).


6.- Existe também decisões judiciais favoráveis e que protegem bens jurídicos de fundamental valor, como é o caso do respeito ao trabalho ofício do motorista e a manutenção da sobrevivência com esse sustento.

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já decidiu questão envolvendo a suspensão de habilitação e a violação do direito profissional ao trabalho( art. 102, III, os arts. 102, § 3º, da constituição, 543-A, § 1º, do Código de Processo Civil, e 323 do RISTF ), como de repercussão geral, o Relator Desembargador Joaquim Barbosa.

Quanto à penalidade de suspensão da habilitação, assim dispôs o acórdão (fls. 217):

"Em relação a pena de suspensão do direito de dirigir veículo automotor, tendo em vista que o recorrente exerce a atividade de motorista profissionalmente, sendo sua remuneração essencial para seu sustento, entende-se, por bem, decotá-la de sua condenação.

Não obstante pesem divergências, tem prevalecido nos tribunais a inconstitucionalidade da aplicação da pena de suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, quando o acusado é motorista profissional.

A penalidade, sem sombra de dúvida, inviabilizaria o exercício do direito ao trabalho, constitucionalmente assegurado, não por falta de qualificação, mas pelo cometimento de uma infração criminal, extrapolando a proporcionalidade que a sistemática penal impõe às penas."

O caso que gerou repercussão geral tratava-se de uma infração de transito cumulada com homicídio culposo, situação bem mais grave juridicamente do que a situação ora recorrida, mas mesmo assim o judiciário deu guarida ao cidadão que utiliza-se da habilitação para trabalhar e gerar o próprio sustento e da família.

O Recorrente tem duas habilitações : - uma é A( moto ) que utilizada para a condução e deslocamento para o serviço de atendimento a domicílio ( suporte de software ) ramo de informática; e a outra a C, para motorização de Van, camionete e caminhão no transporte de equipamento de informática de mais tamanho e peso.

O Assunto é bem longo e complexo até mesmo para o operador do direito, imaginem então como ficam os condutores, na maior parte leigos em relação a interpretação correta das resoluções e normas vigentes. Assim sendo, sempre que o cidadão for autuado, notificado ou suspeitar que foi multado, a melhor decisão é procurar a orientação de um profissional do direito.

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